Inspirado , mais uma vez, pelo raciocínio claro e cristalino de John Kempf, jovem
brilhante e expoente da Agricultura Regenerativa, que eu volto a abordar esse tema.
Quando um lôbo consegue capturar uma lebre para servir de jantar, qual dos dois seria
a praga ? O lôbo malvadão ou a lebre ?
Para o meu amigo Fernando Ataliba do Sitio Catavento, com certeza seriam as lebres
que o incomodaram por anos a fio em sua propriedade orgânica em Indaiatuba, com
lebres trazidas para esse continente pelos hermanos pouco dotados de inteligência do
Rio da Plata .
Seria o lôbo uma praga quando consegue capturar uma lebre ou um veado para servir
de sua própria alimentação ? Ou quando ele captura uma ovelha ?
Seria a lebre uma praga quando ela usa hortaliças orgânicas na sua horta para a sua
própria sobrevivência ? O que definiria uma praga ?
Ou uma larva de joaninha torna-se uma praga quando consome pulgões ?
Seria a definição de praga completamente homocêntrica ? Parece que nos referimos a
essas criaturas vivas, como pragas, sempre que as mesmas nos incomodam, porém
não quando elas incomodam outros organismos, nos quais nós não temos algum
interêsse imediato.
Nós temos interrelações profundas com bactérias, fungos, viroses, nematóides,
insetos, aracnídeos, reptéis, anfíbios, mamíferos e pássaros de todos os tipos. Quase
todos esses organismos são bastante benignos em eco-sistemas saudáveis. Quando o
eco sistema é degradado, eles proliferam e começam a se alimentar de plantas ou
animais nos quais nós teríamos um interesse econômico mais direto. Nós, então,
começamos a rotulá-los de pragas ou patógenos.
Porém, se formos nós os responsáveis pela degradação ou mal-gerenciamento do
ambiente, poderíamos ser taxados de pragas ?
No Brasil, a miopia militante partidária esquerdista, que prevaleceu durante décadas,
batizou todas substâncias tóxicas, é verdade, e usadas na agricultura, como
“agrotóxicos “, sem fazer referência a se são herbicidas, fungicidas, inseticidas,
bactericidas ou nematicidas. Essa simplificação além de burra, depõe contra a sua
profissão que é a de ser um agrônomo, e portanto ter a obrigação de saber diferenciar
os efeitos, deletérios ou não, de uma ou de outra. Colocá-las no mesmo balaio com
uma denominação imprópria e única, não vai ajudar em nada.
Muito menos, irá ajudar em nada criar ridículos “receituários agronômicos” que só
aumentam a necessidade de papel, tinta e burocracia.
Pior seria se fossemos imitar os nossos colonizadores portugueses quando se referem
a essas substâncias reconhecidamente tóxicas com o singelo e angelical nome de
“fitofármacos “. De certo, em Portugal, você poderia comprar Glifosato na farmácia
mais próxima, com essa denominação, o que, de fato, não acontece.
“Defensivo Agrícola”, como agora estão usando, é ainda pior porque muitas vezes
essas substâncias tóxicas ofendem mais do que defendem. Então, melhor seria chama-
los de “Ofensivos Agrícolas “ no lugar de Defensivos Agrícolas.
“Pesticidas” numa tradução direta do inglês “pesticides “, também não seria
apropriado porque o que é definido como peste ou praga ?
Todas essas tentativas de rotulação só visam criar na mente do agricultor a idéia de
que se esses organismos indesejáveis são “pragas “, é porque foram enviadas ao acaso
e o que seria ainda pior , como dizem alguns, por Deus. Dessa forma, essa idéia pré
concebida criaria e legitimizaria a necessidade do uso dessas substâncias tóxicas.
Na verdade, é o ambiente / ecosistema quem determina a presença ou a proliferação
de todos esses sêres vivos “indesejáveis” por questões econômicas.
Se formos cuidar desses ecosistemas, é preciso que seja reconhecido que é o nosso
manejo quem irá determinar se esses organismos irão se expressar como sendo
benignos ou com pestes.
Se quizermos aceitar essa responsabilidade e realmente formos fazer a diferença não
me parece útil rotular organismos vivos como pragas.
Rotulação é um mecanismo sutil e subconsciente de desvio de responsabilidade. “ Eu
não sou responsável por essas pragas” . “Elas invadiram “. “ Estão fora de contrôle “.
“O tempo foi ruim”. “A safra teve chuva demais/ pouca chuva/ Seca/ Calor/ Frio “ , e o
que seria ainda pior, “Foi Deus quem mandou “.
Nem a lebre e nem o lôbo seriam pragas. Eles são simbiontes no ambiente e são
dependentes do Ecosistema maior do qual fazem parte para que tenham condições de
se manter .
Nem ácaros e nem fusarium são pragas ou patógenos. Nem qualquer outro inseto,
nematóide, bactéria ou fungo. Eles são simplesmente organismos presentes no
ambiente que nós criamos para eles. Se eles se proliferarem ao ponto de provocarem
perda de safra, é porque nós manejamos o ecosistema para criar um ambiente ideal
para eles.
Se quizermos que eles não estejam presentes ao ponto de causarem perdas, nós
apenas precisamos manejar o ambiente de forma diferente.
José Luiz M Garcia
Setembro de 2022.
O que define uma praga é o mal que ela causa à sociedade e ao ambiente, como a croplife, por ex.
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Parabéns pelo texto e pelo seu discernimento.
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Boa tarde! Muito satisfeito em ter descoberto o trabalho edificante do Sr. e do Instituto! Cheguei nele pelo video traduzido da Dra. Elaine Ingham no canal “Grupo Agricultura Sustentável” do youtube.
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