ACERTAM OS PROBLEMAS, MAS ERRAM AS CAUSAS
As ciências biológicas aplicadas, como um todo, nos últimos 180 anos tem se destacado por tentar corrigir sempre os problemas, mas nunca as causas. Tanto na Medicina, quanto na Veterinária, como na Agricultura os pesquisadores tentam sempre corrigir os efeitos e se esquecem das causas.
Com relação a pesquisa agrícola, a impressão que temos é a de que não existe “science appeal “ em se pesquisar formação de humus, matéria orgânica e acúmulo de humus no solo, microbiota envolvida na formação de humus e por conseguinte na resistência a seca, etc… Afinal de contas esses tipos de assuntos “sujos”, “rasteiros” ou “chãos”, para não dizer “subterrâneos”, não conseguem atrair a mídia leiga e muito menos encher de orgulho os pesquisadores, que sempre gostaram de posar como pessoas mais inteligentes do que a maioria dos outros mortais.
O bacana e o “científico” mesmo seria criar plantas geneticamente “melhoradas” ( na verdade geneticamente modificadas ) para resistir aos estresses abióticos e que se dane o meio ambiente. Que se dane a microvida do solo. Que se dane o teor de matéria orgânica do solo. Que se dane a formação e o teor de humus do solo. Pouco importa que o lugar do CO2 não seja na atmosfera, mas sim no solo. Na mente desses senhores, a biotecnologia irá sempre resolver tudo.
O Prof William Albrecht, já em 1936, perguntava : “Seria seca ou seria falta de matéria orgânica no solo ? “ ( 1,2,3 )
De fato, existe sempre, pelo menos duas maneiras de se enxergar qualquer tipo de situação. O copo de agua está meio cheio ou ele está meio vazio ?
Da mesma forma poderíamos perguntar: Esse solo está com o pH baixo e ácido ? Ou estariam faltando Cálcio, Magnésio, Potássio e Sódio na Saturação de Bases e, por conseguinte, estaria faltando fertilidade nesse solo ?
Portanto, a acidez no solo deve ser, antes de tudo, encarada como uma falta de fertilidade, mais do que simplesmente como um parâmetro simplesmente químico, ou seja, a quantidade de ions H+ expressos de uma forma logarítmica numa escala de 0 a 14.
Esse solo é degradado e pobre ou ele perdeu a capacidade de reciclar, solubilizar minerais como P, K, Ca e Mg e sintetizar ( fixar ) Nitrogênio, disponibilizar micronutrientes como Mn, Fe e Cobre por falta microrganismos redutores e específicos para cada uma dessas tarefas ?
O solo da minha região, em Elói Mendes, Minas Gerais, tem 5% de Ferro medidos pela analise de Ferro Total usando o mesmo extrator que normalmente é usado em análises foliares. Como é possível, então, haver a mínima possibilidade de alguma planta manifestar “carência de Ferro”, como é frequentemente observado naquela região, e que é facilmente corrigida com aplicações de ferro na forma quelatizada ?
Quando nós sabemos que não é a quantidade de esporos e hifas de Fusarium em um determinado solo que irão determinar os danos causados por esse organismo, mas sim a quantidade de outros organismos chamados de supressivos, que estariam faltando naquele solo, e que irão determinar o aparecimento ou não desses danos, fica mais claro o tipo de “encaminhamento mental” ( pensamento) ao qual nós fomos condicionados a usar desde a faculdade de Agronomia, quando nos ensinaram a rotular os fungos X,Y e Z como “patógenos”.
A bem da verdade, chegamos forçosamente a conclusão de que não existem patógenos, posto que não são eles os causadores das doenças e enfermidades, como no exemplo do Fusarium, mas sim os demais organismos que estão em falta por uma série de razões que, no solo, poderiam ser por excesso do uso de Glifosato (um biocida patenteado para esse fim) ( 4 ), excesso de destruição da estrutura do solo ( mau uso de implementos agrícolas ), compactação (outra forma de se dizer “falta de oxigênio”), falta de condições redutoras no solo ( por carência de plantas de cobertura, falta de cobertura morta ( palhada ), excesso de fertilizantes químicos, etc…), falta de biodiversidade ( por baixos teores de matéria orgânica e humus) e assim por diante.
Ou seja, existem sempre uma ou mais formas de se enxergar uma determinada realidade e, por conseguinte, torna-se urgente redefinirmos até mesmo o próprio conceito de “patógeno “ ( 5 ).
O conceito de “patógeno”, somente empodera o próprio organismo atribuindo ao mesmo uma capacidade intrínseca ( que ele não dispõe ) de sempre causar danos as plantas e, com isso, reforça mais ainda a necessidade do uso substâncias tóxicas na agricultura sob o falso pretexto de “defender” as plantas.
Grande parte dessa responsabilidade pode ser atribuída aos chamados microbiologistas que herdaram esse pensamento enviesado e essa visão míope da realidade da sua tradição de estudar a microbiologia “entre quatro paredes” ( o que eles chamam de laboratório ) iniciada por Pasteur, que só conseguia ver o lado ruim dos microrganismos.
Essa visão deformada da realidade chegou até os dias de hoje, quando sabemos que a maioria das pessoas tem nas suas cabeças a idéia formada e cristalizada de que “micróbio” e “bactéria “ seriam sinônimos de coisa ruim, quando se sabe que ambos os termos significam apenas formas de vida de tamanho diminuto. Nada mais e nada menos.
Agora os chamados “cientistas” agrícolas resolveram melhorar a fotossíntese tentando de forma transgênica ( aquela forma limpinha que é legal e bacana e que a mídia leiga gosta de noticiar ) interferindo em algumas enzimas e processos bioquímicos e fisiológicos por acharem, mais uma vez equivocadamente, que as plantas não estão fazendo um bom trabalho e que esses senhores, que não sabem a diferença entre o norte e o sul, poderão melhorá-las.
As vezes o tiro sai pela culatra porque a Natureza tem seus próprios meios de mostrar a essas pessoas o seu ridículo e o quanto elas ainda precisam crescer e evoluir em termos humanos para poderem ter a capacidade de ousar e querer consertar a obra divina ( 6 ).
Na década de 70, o cientista Charles Y. Tsai, Fisiologista Vegetal, na época ligado a Purdue University, demonstrou que o Milho, teria um potencial de produzir até 1.100 sacas por hectare.
Hoje, alguns produtores americanos já atingiram a marca dos 500 sacos por hectare e estão querendo quebrar a barreira dos 600 sacos/ha.
Agora surgem noticias de que na China, com o novo método de Plantio com Hiper Densidade, com 300.000 plantas por hectare, estão prestes a produzir acima das 40 toneladas de milho/ha que equivaleria a 660 sacas por hectare. Em tempo, a média americana, no país do milho, é a de 180 sacas por hectare.
A conclusão clara e óbvia a que chegamos é a de que nós estamos nos contentando com 15 a 30% do potencial genético da maioria das lavouras. Se isso acontece é porque não estamos sabendo nem conduzir e nem nutrir as plantas de forma adequada e, portanto, não seria a hora de querer modificar o DNA de nenhuma planta objetivando aumentar a produção, mas sim ver de que forma poderíamos influir na nutrição e no manejo das plantas para poder intensificar e maximizar a fotossíntese.
Quem sabe até aumentar a densidade de plantas por unidade de área como estão fazendo os chineses com o plantio em Hiper Densidade e os americanos com o seu plantio de milho em fileira dupla.
Que me perdoem as empresas de fertilizantes que, para aumentar as suas vendas, conseguem desenterrar verdadeiras múmias do que eles chamam de “nutrição de plantas” e fazer uma série de vídeos desinformativos. A Agricultura não precisa de mais fertilizantes químicos solúveis iônicos. A Agricultura precisa de mais cérebros.
Será o cérebro, e a inventividade humana, quem irão resolver todas as nossas atuais dificuldades e alimentar o mundo futuro, sempre respeitando o meio ambiente e sempre de mãos dadas com a biologia, pois essa é ainda a melhor ferramenta da qual a espécie humana dispõe.
José Luiz M. Garcia
Instituto de Agricultura Biológica
Janeiro de 2020.
Referências
- Albecht, W.A. ( 1938 ) Soil and Men, U.S. Dept. of Agriculture, Yearbook of Agriculture, p.p. 347-360, 1938.
- Albrecht, W.A. ( 2000) The Drought Myth: An absence of water is not the problem, Acres USA, Republicação, 2000. https://soilandhealth.org/wp-content/uploads/01aglibrary/droughtmyth.pdf
- Albrecht, W,A. ( 1954 ) Droughts – The Soil As Reasons For Them, The Albrecht Papers, Volume I, Foundation Concepts, Ed. by Charles Walters, Acres USA, Metairie, Louisiana, pp. 262-275, 1975.
- Allegrini, M. et all ( 2019 ). Suppression treatment differentially influences the microbial community and the occurrence of broad host range plasmids in the rhizosphere of the model cover crop Avena sativa L. PLoS One 14, e0223600 (2019).
- Syltie, Paul (2002) HOW SOIL WORKS – A Study Into the God-Plane Mutualism of Soil and Crops, Xulon Press, Fairfax, VA, 165 pgs.
- Lobo, A.K.M., et all ( 2019 ) Overexpression of ca1pase Decreases RuBisCo abundance and Grain Yield in Wheat, J. Plant Physiology, http://www.plantphysiol.org/content/plantphysiol/181/2/471.full.pdf
Boa tarde,
Gosto muito dos seus posts e estou de acordo com sua ótica. Não entendo nada de agricultura, embora tenha um sítio orgânico em Caconde/SP, pois sou PhD em Ecolinguística. Estudo o discurso “ambiental”, o “sustentável” e outras falácias do gênero. Daí indentificar-me com sua postura crítica. A título de ilustração, utilizo o termo “biocida” para o glifosato, Roundup, o que for, desde o princípio. É o que ele faz. Mata a vida. Fim. A razão do meu e-mail é que as minhas terras pouco ou nada produzem. Já fiz análises de solo. Dá carencia de uma ou outra coisas, mas praticamente nenhuma muda vai pra frente. É impressionante. Tudo seca, mesmo as plantadas agora em plena chuva. Já pedi ajuda aos agrônomos de Caconde, mas creio que eles sabem menos do que eu. Cada um diz uma coisa. É de enlouquecer. Tenho deixado o “mato” crescer faz três anos, para criar biomassa. Plantei feijão de porco nos dois últimos anos. Nada. Gostaria de saber se você tem algum interesse em me ajudar/orientar, pois já gastei pequenas fortunas em farinha de osso, torta de mamona, Ekosil, Yoorin Master , Orgasol, Bacsol ,etc.
Grato,
Dr. Roberto Lestinge
P.S.: Estive a ponto de abrir meu sítio para pesquisa com a EMBRAPA de Jaguariúna. Cancelaram o acordo por “falta de verba para a gasolina”. Sem comentários.
________________________________
CurtirCurtir
Coloco o seu caso a disposição dos agrônomos que seguem esse blog mas pelo o que vc relatou deve ser mesmo falta de
biodiversidade no solo.
O caminho seria olhar as analises de solo e ver o que poderia ser adicionado para acelerar o processo
e depois semear plantas de cobertura inoculadas com essa biodiversidade via extrato de composto.
Um minhocário não seria uma má idéia.
CurtirCurtir
Bom dia Roberto, sou engenheiro agronomo, trabalho com sistemas de produção biológicos e de base ecológica. Estou disposto a ajudar, se quiser, podemos conversar pelo whats: 19 999817054
CurtirCurtir
Há muito tempo venho batendo nessa mesma tecla de ir direto na causa e não só no efeito.
Texto espetacular que vai me ajudar muito a abrir algumas mentes extremamente fechadas e bitoladas.
Parabéns!
CurtirCurtir
Dr. Vinagre Boa noite. Você poderia nos dar sua opinião sobre esses protetetores solares para plantas que estão vendendo, tipo o Protex da Santa Clara. Eles dizem que o produto diminui a incidência dos raios solares nas plantas aumentando a fotossíntese. Pensei ser o contrário.
CurtirCurtir
Certo e Errado.
Porque ?
Se houver excesso de sol eles estão certos, porque acima de 28 graus C as plantas mudam o metabolismo
de Fotossíntese para Fotorespiração e nesse modo consomem mais energia do que produzem.
Mas se a temperatura for inferior a 28 graus C , nesse caso eles estariam errados.
Vai depender da temperatura e da incidência de UV.
CurtirCurtir