Aumentando o P disponível sem o uso de fertilizantes solúveis
Muito embora o fósforo seja um dos elementos menos utilizados pelas plantas em quantidade, com níveis considerados ótimos entre 0,3 a 0,5% da matéria seca, ele é muito importante para a produção e transferência de energia, que é fundamentalmente usada na fotossíntese e demais funções fisiológicas nas plantas sendo aquelas mais conhecidas como elemento estrutural do RNA e DNA, produção de ADP e ATP, nas diversas frações ricas em fósforo como fosfolipídeos, fitatos, crescimento de raízes, na determinação da distribuição de açucares para as raízes em plantas deficientes e em plantas suficientemente supridas de fósforo, etc..
Entretanto, o foco desse artigo não é, em absoluto, discutir a importância fisiológica do fósforo como um nutriente. Para isso existem inúmeros livros-texto de agricultura, sendo que o melhor deles na minha opinião e na opinião do Prof. Emérito da Universidade de Purdue, Dr. Don Huber, com o qual tive o prazer de ter conversado, mais uma vez, no início desse mês em Minneapolis, continua sendo o livro de Horst Marschner, uma verdadeira biblia sobre esse assunto ( 1, 2 ).
As plantas necessitam sim ter ao seu dispôr um constante fornecimento de fósforo disponível o que não significa dizer que ele tenha que ser obrigatoriamente solúvel.
Na agricultura biológica regenerativa é imperativo que cada insumo utilizado tenha um impacto positivo na biologia do solo, tanto quanto na saúde das plantas. Hoje em dia, não é mais admissível que um insumo tenha efeito positivo nas plantas e negativo na biologia do solo. O maior problema é que várias fontes de fósforo e nitrogênio solúveis são conhecidos por exercerem efeitos negativos pronunciados na biologia do solo.
O fósforo solúvel, por exemplo, é conhecido por interferir negativamente no trabalho das micorrizas, das bactérias solubilizadoras de fósforo e na atividade da enzima fosfatase, criando uma dependência contínua das aplicações de fósforo solúvel. Nesse caso a tecnologia, ou a “ciência” dos solos, substituiu a biologia desenvolvida pela Natureza ao longo de bilhões de anos pela alimentação artificial no melhor estilo hidropônico.
Um dos objetivos da agricultura biológica regenerativa é desenvolver tecnologias que permitam uma liberação biológica robusta e gradativa dos nutrientes a um determinado nível que, pouco ou quase nada de nutrientes adicionais sejam necessários para a adequada condução daquela lavoura ( 3 ).
A pergunta seria como chegar a esse ponto se o seu solo tem níveis de nutrientes muito baixo, para começar.
A diferença entre nutriente Disponível x Solúvel está ganhando terreno hoje em dia entre os agricultores inteligentes e será motivo de um outro artigo que estou no momento traduzindo, de autoria do Prof. William Albrecht e que será oportunamente publicado nesse blog sob o título de “Insolúvel porém Disponível “ ( 4 ).
O objetivo desse texto é exatamente propor e discutir novas formas de como tornar o fósforo disponível as plantas da maneira menos agressiva ao meio ambiente e menos onerosa para o agricultor inteligente, sustentável e regenerativo.
O primeiro passo para quem está disposto a aumentar o seu nível de Fósforo disponível é obter uma analise de Fósforo Total do seu solo, simplesmente porque não dá para liberar aquilo que não existe. No meio da Eco Agricultura ( no Brasil erroneamente denominada de AgroEcologia ) o que mais existe são pessoas que acreditam que podem criar algo a partir do nada, contrariando flagrantemente a Lei da Conservação da Matéria. Se o nível de fósforo no solo não for, por exemplo, acima de 100 ppm de P Total não dá para querer ter alguma coisa de razoável em termos de P solúvel/disponível, contando única e exclusivamente com a biologia do solo.
Já fazem pelo menos uns 10 anos que venho trabalhando com esse parâmetro. Faço as minhas analises no IBRA de Sumaré, no estado de S.P. Métodos de analise são mais ou menos como unidades de medida. Existe o sistema Métrico e o sistema Imperial. Não é porque eu meço as coisas em polegadas que uma medida seja melhor ou mais apropriada do que a outra quando feita em centímetros. Mas se você for fazer alguma medida em outra unidade não poderá comparar com a sua em hipótese alguma.
Como esse método de analise de solo não é um método “recomendado” e padronizado pelas autoridades de solo brasileiras você não pode comparar os resultados de um laboratório com o outro. Portanto, eu fico com o IBRA por uma questão de coerência e praticidade. Mas isso não impede que você convença o seu laboratório a obter a mesma metodologia e proceda essa analise para que você desenvolva o seu próprio controle ou, então, que envie as suas amostras pelo correio diretamente ao IBRA.
Depois, caso o seu P Total esteja acima de 100 ppm de P Total ( pelas analises do IBRA ) você poderá usar algumas bactérias solubilizadoras de Fósforo desenvolvidas pela EMBRAPA e hoje comercializadas com o nome de BiomaPhos ( www.bioma.ind.br ) composto de cepas isoladas e testadas de Bacillus subtilis e Bacillus megaterium, isto é, BRM 119 (Bacillus megaterium) e BRM 2084 (Bacillus subtilis) , aplicando-as via tratamento de sementes ou via sulco de plantio.
Uma outra prática interessante, descrita por Kempf ( 3 ), seria misturar alguma fonte de fosfato natural, reconhecidamente de baixa liberação de fósforo mas de elevado teor de P2O5 total, com esterco de ruminantes, como bovinos ou caprinos, antes da aplicação. Com essa prática simples, foram observadas, ao longo de dez anos de utilização, respostas a aplicação do fósforo de quase quatro vezes a aplicação do fosfato natural isoladamente, quando se considerava os níveis de P no solo ou os teores de fósforo na seiva das plantas medidas pela Sap Analysis.
Eu também já pude observar, há 20 anos atrás, que outras fontes de matéria orgânica como turfas quando misturadas ao fosfato natural também aumentam consideravelmente a liberação de fósforo do Fosfato Natural. No caso, a mistura de 45% de Fosfato Natural + 45% de Turfa e 10% de Enxofre Ventilado, em 15 dias apenas, duplicou o teor de P2O5 solúvel em acido cítrico a 2%.
Pesquisa recente ( 5 ) apenas reforça o que já conhecíamos já há algum tempo que a mistura de esterco de ruminantes com fosfato natural aumenta o teor de matéria orgânica no solo e a atividade da enzima fosfatase. Aumentou a disponibilidade do fósforo para a planta sem contudo aumentar a solubilidade. O que também significa dizer que o fósforo fica em uma forma não lixiviável e, portanto, não poluente. Eu creio que esse é o verdadeiro papel da agricultura do século 21.
Fico imaginando o resultado de uma mistura de esterco bovino, com fosfato natural acrescido de um pouco de turfa e enxofre ventilado.
Valeria a pena tentar e testar.
José Luiz M Garcia
Instituto de Agricultura Biológica
Dezembro de 2019
Referências
- Marschner, Horst ( 2003 ) Mineral Nutrition of Higher Plants, 2nd Edition, Academic Press, 889 pgs.
- Huber, Don ( 2019 ) Informação Pessoal, Acres USA Conference 2019, Minneapolis, MN, December, 2019.
- Kempf, John ( 2019) Building Available Phosphorus without soluble fertilizers, John’s Blog, regen.ag Academy, johnkempf.com
- Albrecht, William A ( 1996 ) Insoluble yet available, The Albrecht Papers, Vol. I – Foundation Concepts, pg. 113 – 126, Ed. by Charles Walters, Acres USA Metairie, Louisiana, 515 pgs.
- Omenda, J.A, et all ( 2019) Soil Organic Carbon and Acid Phosphatase Enzyme Activity Response to Phosphate Rock and Organic Inputs in Acidic Soils of Central Highlands of Kenya in Maize, International J. of Plant & Soil Science, 30 ( 2 ): 1-13, 2019.
Prof. O enxofre laminado ou pastilhado, que a Petrobras produz em São Mateus do Sul ,no Paraná, na usina de xisto , é um bom produto para usar na agricultura?
Alguém me disse que não é eficiente para agricultura.
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Caro Mario Brunati,
Bom Dia.
Se a Petrobras está vendendo o enxofre sob a forma de pastilhas ou melhor dizendo “lentilhas” é porque
trata-se do produto comercial conhecido como Enxofre elementar contendo pelo menos 90% de S.
Se for realmente enxofre elementar a 90%, eu não vejo porque ele não deva funcionar.
Existe outro artigo nesse mesmo blog sobre o Enxofre. Faça um favor a esse alguém que lhe disse
que o Enxofre Elementar não é eficiente sugerindo que ele leia, em primeiro lugar, esse artigo.
O problema é que o Enxofre Elementar tem que ser oxidado a SO4 antes de ser utilizado pelas plantas.
Mas isso ocorre no solo entre 2 a 4 semanas dependendo da temperatura, umidade, etc…
Leia o artigo sobre o Enxofre.
O problema é que as pessoas hoje em dia querem tudo de imediato. E esse imediatismo é que está levando
o nosso planeta a destruição. O SO4 ( sulfato) pode ser absorvível pelas plantas mas, por outro lado,
é extremamente lixiviável.
Assim como todos os demais fertilizantes ditos solúveis cantados em prosa e em verso pela industria química
e seus lacaios de aluguel como grande parte da academia que se dedica ao estudo dos solos.
Atenção bronzeados do Jardim Botânico, eu disse GRANDE PARTE e não TODOS.
Não vistam a carapuça antecipadamente.
Essa pessoa que lhe disse que o enxofre elementar não funciona sofre de desfuncionalidade cerebral
exatamente por ouvir demais essa turma da química. Funciona sim, só que ao seu devido tempo.
Já está passando da hora de deixarmos de querer ser químicos ( querer ser porque ser mesmo jamais o seremos )
e passarmos a ser Agrônomos.
Um grande abraço e Feliz Natal.
José Luiz
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Muito agradecido, pela sua resposta. Muito clara e elucidativa.
Feliz Natal .
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Excelente texto, José Luiz!
Temos observado, na prática, a disponibilidade do fósforo em solos com teores de P total acima de 100 ppm, e, disponibilizando-o via micro-organismos e manejo.
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Muito Obrigado
O caminho é esse. Esse ano que se aproxima promete muito.
Desejo a todos vcs ai de Campo Grande um Feliz Natal e um próspero 2020.
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Eu como pequeno produtor, fiz um pequeno teste para P:
Fiz uma cava 1m x 1m retirei toda a terra até a profundidade de 25cm.
Coloquei a terra crua de pastagem (sem correção e adubação por pelo menos 15 anos) que queria “analisar”, plantei milho sem qualquer adubo ou corretivo, cobri com serrapilheira de mata, ele nasceu e demonstrou forte sinal de deficiência de fósforo nas folhas, pulverizei (solo e planta) com um preparado fermentado caseiro (esterco bovino + rapadura).
As folhas roxas sumiram em poucos dias, ele continuou crescendo, depois aparentemente lhe faltou N. Mas a experiência estava concluída.
Quando possível farei a análise junto ao laboratório.
Obrigado Professor!!
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